segunda-feira, 23 de julho de 2012

O atirador de pedras

"Por maior que sejam as dificuldades, sempre existe uma maneira digna de resolvê-las"
           


Eis a narração de um fato curioso ocorrido no tempo em que Saul era o rei de Israel, e o sábio profeta Samuel liderava espiritualmente o povo.

Conta-se que um dia três rapazes praticavam, junto às montanhas da Judéia, o esporte de lançar pedras com a funda, uma espécie de atiradeira, que servia como arma contra os animais selvagens.

Um deles era caçador, o outro era tecelão e o terceiro tocava harpa. Com grande velocidade, as pedras soltavam da funda e iam zunindo até baterem na encosta da montanha.

Porém, quis a fatalidade que uma delas atingisse em cheio o rosto de um pastor desavisado que, contornando a montanha, entrou sem saber naquela zona de tiro. A pedra criou imediatamente um grande hematoma sobre o olho daquele homem.

Revoltado com o ocorrido, ele não aceitou qualquer desculpa e levou o caso ao profeta Samuel, que julgava o povo no templo.

- Esses rapazes me causaram grande dano. Conforme determina a Lei de Deus, entregue a Moisés no deserto do Sinai, exijo que aquele que irresponsavelmente lançou a pedra seja, da mesma forma, ferido sobre o olho, sofrendo o mesmo dano que me infligiu - disse a vítima.

O profeta estava diante de uma causa simples de olho por olho, dente por dente. Havia, porém, uma dúvida. Como as pedras foram atiradas ao mesmo tempo, não se podia precisar de que funda havia saído aquela que atingira o homem.

O profeta, portanto, determinou que o alfaiate, o mais velho e o mais forte entre os três, recebesse a pedrada sobre o olho.

- Meu senhor, sábia é a vossa palavra, porque vem da Lei de nosso Deus. Porém, peço que tenhais clemência. Sou alfaiate e muito preciso de minhas vistas para exercer a profissão que me dá o sustento. Todavia, sabemos que o caçador, quando estica seu arco para desferir a flecha que abaterá sua caça, fecha um dos olhos. Ora, como só precisa de um para exercer sua profissão, que seja ele a sofrer a pedrada - argumentou o primeiro rapaz.

De pronto o profeta concordou e determinou que a sentença recaísse sobre o caçador.

- Meu senhor, quem sou eu para me opor à sabedoria de vossas palavras? Se sou eu a sofrer o dano, que assim se cumpra na vida do vosso servo. Gostaria de lembrá-lo, entretanto, que mesmo fechando um dos meus olhos quando estou para atirar a flecha, ao me deslocar pelo mato preciso os dois, para me defender das feras que procuram me atacar. É sabido que o tocador de harpa, que não corre nenhum perigo em sua profissão, ao dedilhar seu instrumento fecha ambos dos olhos, para se concentrar no som que sai de suas cordas afinadas. Ora, como não lhe faz falta nem sequer um dos olhos para exercer sua arte, que nele se cumpra a vossa sábia sentença - refutou o segundo.

Neste instante, o tocador de harpa, que era o mais jovem e menor entre eles, ao ver que não tinha outro a quem passar a sentença, e vendo cair sobre ele o peso e a dor daquela pena, com sabedoria clamou:

- Meu senhor, profeta de Israel, de que adiantará a este pastor que eu sofra a dor de uma pedrada sobre os olhos? Porventura não lhe será muito mais valioso que o alfaiate lhe prepare uma capa, com a melhor e mais grossa lã dos carneiros, para lhe servir de agasalho contra o frio que varre as noites do deserto? Da mesma forma, que o caçador lhe prepare um suculento cozido da caça do campo, que lhe renove as forças e assim possa descansar de todo o transtorno que sofreu? - sugeriu o harpista.
A esta ideia, a vítima concordou de pronto, expressando esfuziante alegria.

- Mas e tu, sábio rapaz, qual será a tua parte na sentença que indenizará o dano da vítima? indagou o homem de Deus.

- Peço ao meu senhor que considere como minha contribuição o fato de ter encontrado nesta causa o caminho para a paz, alegrando a vítima e poupando da dor os que sem intenção lhe causaram dano — respondeu ele.

O profeta Samuel, impressionado com a esperteza do rapaz, mudou a sentença e assim ninguém teve de sofrer a dor da pedrada.

Alguns anos mais tarde, aquele jovem tocador de harpa, com sua habilidade de atirar pedras com a funda, viria a matar o gigante Golias numa memorável batalha. Com sua sabedoria e simplicidade, ele se tornaria, em breve, o mais famoso e amado rei da história de Israel.

Quando a punição recai sobre alguém, há os que tentam passá-la para algum outro e há os que tentam encontrar uma saída melhor. Nesta história, aprendemos que sempre existe uma maneira honrada e digna de enfrentarmos as consequências de nossos erros. Que o Senhor nos ajude a encontrá-la.

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