“Grande quantidade e pouca qualidade” é um clichê bastante usado quando o assunto é a infinidade de dados que recebemos hoje em dia, principalmente quando o assunto são as mídias digitais. Se em parte pode ser verdade, algumas pessoas administram bem o que aprendem. Os mais velhos esforçavam-se para manter o foco, e estranham a capacidade dos jovens de se dedicarem a vários afazeres ao mesmo tempo. A convergência de mídias é real para eles: ao mesmo tempo em que estudam, navegam pela internet, usam o telefone celular, ouvem música e até mais. Muitos da geração anterior acham que há algo errado nessa inundação de dados, com enorme déficit de atenção e pouca profundidade temática.
Será que há mesmo algo errado com eles? Segundo o especialista em aprendizagem informal Luiz Algarra, não necessariamente. “Nossos filhos não estão se encaixando em nossas projeções e, por isso, estamos pensando que pode haver algo errado com eles”, explica.
Segundo Algarra, estamos chegando a um ponto importante da história do uso da tecnologia: os jovens conectados passam a disputar mercado com seus antecessores e, por isso, passam a ser repelidos com uma série de rótulos. Para ele, o “abismo tecnorrelacional” se acentua. “Para muitos de nós com mais de 40 anos, a intensidade e a variedade dos objetos de linguagem já atingem uma velocidade quase insuportável.”
Ao contrário dos mais velhos, os jovens estão acostumados a essa rapidez vertiginosa. Muitos deles já nasceram nessa era, e para eles é tudo muito normal. Aprendem a viver e estão crescendo nela. Em contraste, a maioria dos que já passaram dos 40 têm uma maneira de pensar mais linear. Preferem terminar um raciocínio antes de emendar em outro. Quem pensa assim, tende a achar que os mais novos não aprendem direito por não se aprofundarem o suficiente, dada a rapidez com que trafegam entre os assuntos.
Tudo ao mesmo tempo
Como uma geração que cresceu assistindo a um único canal de tevê por horas seguidas (antes do controle remoto) e a ler textos impressos com atenção exclusiva pode entender um adolescente com oito, nove janelas abertas de vez na tela do computador enquanto fala ao telefone, faz um lanche e também vê televisão (mudando de canal a todo momento, controle na mão). Para Luiz, é simples: eles se viciaram nessa rapidez, e podem administrá-la a seu favor, mesmo que outra pessoa, de fora, não entenda isso. Claro, gente com dificuldade de foco ou com facilidade para prestar atenção em várias tarefas sempre existiu, independentemente da geração. Mas a tendência da multitarefa é maior com as novas mídias.
“E se o modo como nós aprendemos tudo até agora na escola, memorizando a tabela periódica, equações matemáticas e os rios do Amazonas, estivesse mesmo muito errado?” A indagação parte de Algarra, que mostra o outro lado: “Nossos professores eram bancos de memória ambulantes, repletos de citações e exemplos. Poucos mestres tinham a capacidade de se envolver, se relacionar com os alunos e nos levar a uma experiência única de sabedoria.”
Pontes sobre o abismo
O conhecimento diferente pode parecer ignorância, se visto de fora. “Nós dependíamos da memória, eles dependem das buscas. Nós resumíamos textos, eles condensam listas, buscam por categorias, tipos, formatos, datas, assuntos, temas, palavras-chave e tags. Não aceitamos nem o modo como fazem a gestão de suas amizades e os acusamos de manterem fazendas de falsos amigos representados por carinhas de Facebook”, considera Luiz. “Se não tornarmos mais flexíveis nossas premissas e frequentarmos um pouco mais os espaços multitarefa por onde os jovens fluem, as novas pontes entre nós nunca irão aparecer.”
Segundo o especialista em educação (que a vê de forma inovadora), “quando a maturidade bloqueia a transformação, surge a velhice”. Luiz acha que cada um tem exatamente aquilo que precisa para viver, em seu tempo, a seu modo. “Não precisamos funcionar como os jovens, mas precisamos saber que o nosso modo não é mais o único.”
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