quarta-feira, 26 de dezembro de 2012

Costumes da Bíblia - O trabalho dos pastores



Atividade fundamental para povos antigos e atuais, o pastoreio virou sinônimo de dedicar a vida a orientar os seguidores de Jesus





De tão importante para os tempos bíblicos, o ofício de pastor de ovelhas e outros animais emprestou, com o tempo, seu nome ao sacerdócio, ao ato de uma pessoa liderar e orientar outras na fé, zelando por elas e mostrando-lhes os caminhos dos preceitos de Deus. Um rebanho à solta pode ir para lugares perigosos, ser atacado a qualquer momento por predadores, sem alguém que os defenda, que zele por seu crescimento saudável, que garanta boas pastagens, que evite que sejam roubados. Os animais dependem dele para sua existência. Poderiam ser selvagens e “se virar” bem, mas ninguém nega que é bem mais seguro ter a guarda de um pastor.

Também não raro, um pastor tornava-se líder de sua tribo. A própria Bíblia conta a história de valorosos pastores. Sim, pastores de gado, como os que visitaram o recém-nascido Jesus e espalharam a Boa Nova. Pastores de homens, como Paulo, que conduziu muita gente ao Evangelho. E pastores dos dois tipos, que, em algum ponto de suas vidas, estiveram entre as cabras e ovelhas, para depois tornarem-se valorosos líderes, Na época da Bíblia e nos dias atuais, em vários pontos do mundo, um pastor de animais começa seu trabalho cedo, muitas vezes ainda criança. Desde a infância sente o peso da responsabilidade, pois muitas vezes está em suas mãos o sustento da família ou até da comunidade. Era comum em tempos bíblicos que famílias mais pobres, que não podiam contratar pastores, incumbissem do serviço um filho (caso de Davi, como na foto acima, da minissérie "Rei Davi", da Record).


 espirituais de seus semelhantes. Caso de Abraão, senhor experiente de muitos rebanhos, depois patriarca de muitos patriarcas. De Moisés, que após fugir do ambiente palaciano egípcio apascentava o rebanho do sogro, para mais tarde conduzir todo o seu povo rumo à Terra Prometida. E de Davi, cuja experiência com a funda para afugentar predadores que atacavam suas ovelhas serviu para matar o gigante Golias, para mais tarde tornar-se um dos maiores reis da história.

Patrimônio vivo
Quando Abraão saiu de Ur segundo ordem de Deus, converteu todo o seu patrimônio em gado. Desse modo, poderia transportá-lo na vida seminômade que se iniciava (ilustração ao lado). Ovelhas, cabras, bois e muares eram um tesouro que andava com as próprias pernas, garantia carne e leite para alimento, peles para roupas e tendas, ossos e chifres para a confecção de utensílios, além do valor comercial. Vale também citar os sacrifícios dos animais para Deus, tão importantes naqueles tempos.

Quando o povo deixou de ser nômade, ainda assim os pastores eram necessários. Continuava-se a precisar de tudo que era aproveitado do rebanho. Em toda a Bíblia estão os chofares (trombetas), vasilhas (como a que continha o óleo para unção) e até adornos, feitos de chifres. Tendas e agasalhos eram feitos de peles e lã (sacos eram feitos com pelos de cabra tecidos, assim como algumas cortinas do Tabernáculo). Carne e leite continuam até hoje como parte essencial da subsistência. Alguns povos os obtêm de rebanhos pastoreados à moda antiga (como os atuais beduínos), sem aparato tecnológico.

Na tradução bíblica, a mesma palavra designou ovelhas e cabras. Podia significar, respectivamente, um ovino, um caprino ou ambos. As cabras se dão melhor com terrenos mais acidentados, enquanto ovelhas preferem os mais planos. Essas preferem as pastagens do solo (grama e capim), enquanto aquelas também se alimentam de arbustos, às vezes ajudadas pelos pastores, que baixavam os galhos mais altos com seu cajado.

O leite de cabra era utilizado pela versatilidade. O animal é bem menor e mais fácil de manter que uma vaca. Uma cabra saudável pode dar cerca de 3 litros diários de um leite muito saudável. Com ele, fazia-se o leben (um tipo de coalhada) e queijos muito nutritivos para crianças e adultos. Também era comum que uma cabra fosse deixada com a família, enquanto as outras iam com o pastor para o campo. Além de ela fornecer o leite em casa, muitas vezes ganhava o carinho dos moradores do lar e virava um animal de estimação.

Quando o povo começou a moradia fixa, era comum que a comunidade optasse por um pastor que levava o rebanho de todos para campos distantes, já que não havia espaço e alimento suficientes entre as casas e vias.

Tarefas
Na primavera, após o período de chuvas, havia bastante pastagem verde. Depois das colheitas, o que sobrava era deixado para que os animais comessem. Quando essa opção de alimento acabava, era a vez de rumar pelos campos atrás de ervas secas. A presença de pasto fresco também podia ser sinal de água retida após as chuvas, permitindo que o rebanho ficasse por mais tempo em determinado lugar (as “águas de descanso” e “pastos verdejantes” citados no famoso Salmo 23 de Davi, que entendia muito bem do assunto). Quando essa água acabava, a de poços era usada.


Os perigos para o rebanho não eram poucos. Por isso, a proteção era constante. Em vários livros da Bíblia (como Juízes, 2 Reis e Amós) citam predadores naturais como leões e ursos. Também eram comuns hienas e chacais. A velha figura dos lobos devorando cordeiros já era notória. Os pastores arriscavam suas vidas para afugentar ou matar os animais selvagens. Eles tinham de pagar ao dono pela perda ou roubo de um animal, conforme o caso, e tinham de provar a causa da ausência dele (Êxodo 22.10-15).

Era comum que deixassem as ovelhas em um lugar seguro para procurar uma desgarrada. Caso alguma se machucasse, ficasse doente ou mesmo cansada demais, o pastor a carregava nos ombros (como Jesus descreve em Lucas 15.3-6).

As armas para proteger o rebanho eram simples e eficazes. O bastão de madeira era pesado, e podia ter pregos nas pontas. A funda, bem usada, afugentava ou matava predadores, ou mesmo era usada para, de forma mais fraca, advertir ovelhas que se desgarrassem. Uma grande vara (cajado), geralmente com uma curva na extremidade, era usada tanto na condução quanto para repreender alguns dos componentes mais rebeldes do gado. Também ajudava o pastor a se escorar em terrenos difíceis. A ponta do cajado, mergulhada em tinta, servia para marcar uma em cada dez ovelhas, que era dada em dízimo (Levíticos 27.31-33).


Geralmente, o pastor carregava uma bolsa, o alforje, no qual levava alimentos, pequenos utensílios e até pedras para funda. Alguns faziam versões menores da bolsa só para essa munição. Dentro do alforje poderia estar uma pequena flauta de bambu, um pequeno alívio na solidão do pastoreio, ou para alegrar festas entre o povo. Davi tocava muito bem uma harpa, que o distraía e apascentava o rebanho (ilustração acima). O costume de tocar o instrumento o acompanhou em seus dias de rei.

À noite, era comum que o pastor reunisse o rebanho em um cercado de pedras empilhadas (chamado redil, na foto abaixo), com plantas espinhosas no topo, com uma abertura na frente, onde ele se deitava, caso adormecesse, formando uma espécie de portão vivo, que sentiria se algum animal quisesse sair. Cavernas também eram usadas, e um muro de pedras era feito na entrada, com a mesma abertura. Jacó descreve a vida difícil de pastor, à mercê de frio, fome e a impossibilidade de dormir em algumas noites (Gênesis 31.40). Alguns levavam pequenas tendas, fáceis de transportar e armar (Cântico 1.8).



O cruzamento e a assistência nos partos geralmente eram coordenados pelo pastor. Alguns também cuidavam do trabalho de tosquiar as ovelhas.

De volta aos povoados, o rebanho era depositado em currais bem arejados, com uma parte coberta e outra ao ar livre, onde os animais ficavam, conforme o clima.

Era comum que cachorros fossem usados no trabalho. Cães pastores ainda hoje são parceiros na atividade, mesmo em algumas fazendas mais modernas, geralmente animais confiáveis e eficientes, leais ao dono. Quase sempre ficam depois dos rebanhos durante as viagens, fazendo com que os animais desgarrados voltem ao grupo, cercando-os.

Intimidade
Com o tempo, pastores e rebanho se entrosavam. O homem passava a conhecer o temperamento de alguns animais, que criavam um laço de obediência a ele. Conhecer um a um lhes permitia que fossem devolvidos aos donos certos, quando era o caso dos pastores que tomavam conta de rebanhos coletivos. “Eu sou o bom pastor; conheço as minhas ovelhas, e elas me conhecem a mim”, disse o próprio Jesus em João 10.14. Ele mesmo, carpinteiro, também conhecia a fundo o trabalho do pastoreio e seus segredos, que muito usava como exemplos em seus ensinamentos.

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